Uma população encurralada entre criminosos e policiais fortemente armados, que atiram para todos os lados em pleno cenário urbano. Esta é a rotina de milhares de moradores das favelas do Rio de Janeiro. E é também o que indica ser um dos principais erros da Polícia Civil na operação que deixou 28 mortos no Jacarezinho, na quinta-feira passada: agir pela lógica do confronto, não pela investigação e inteligência. “A Polícia Civil não está lá para fazer operação atirando; deve investigar, ir atrás dos criminosos, cumprir os mandados de prisão, mas não trocar inúmeros tiros em uma área urbanizada. Se não tivessem feito essa bobagem, e sim esperado para, aos poucos, ir prendendo cada um deles, não teria morrido um policial, nem ninguém”, opina o ex-investigador e cientista político Guaracy Mingardi, que há mais de duas décadas estuda as polícias, as organizações criminosas e as políticas brasileiras de segurança pública. O pesquisador fala ainda sobre como as polícias civis se “militarizaram” ao longo dos anos —no Rio, em especial, com o surgimento do Comando Vermelho. Na avaliação do especialista, porém, a estratégia deveria ser revista. “Você faz uma guerra prolongada e nem consegue diminuir a droga circulando? Alguma coisa está errada nessa política”, afirmou, em entrevista à Mariana Assis.
Também fomos à casa do historiador britânico Peter Brown, 85 anos, nos Estados Unidos, para uma longa conversa sobre a tendência política de manipular os fatos históricos para incitar medo na população. Ele é considerado por muitos o maior historiador vivo da língua inglesa, desde que, aos 36 anos, se debruçou sobre a Antiguidade tardia e o colapso de Roma. “Essa foi minha principal motivação: entender a natureza exata de certas crises, como as mudanças no Governo do Império Romano nos séculos III e IV. Queria descobrir se tinham sido desastrosas ou, na verdade, mudanças de ajuste da evolução; um equilíbrio entre a continuidade e a descontinuidade, a fragilidade e a resistência”, disse à jornalista María Antonia Sánchez-Vallejo. “Esquecer é uma tragédia. Mas acho que o problema são as lembranças pela metade.”
E ainda nesta edição, falamos com o músico Mbé, como assina o carioca Luan Correia. Nascido e criado na Rocinha, a comunidade que dá nome ao seu disco homônimo, um fenômeno que desponta na música experimental brasileira. O jornalista Leonardo Lichote conta como Correia cresceu sob a influência de grandes nomes do rock, dominado por músicos brancos, e que encontrou seu lugar ao pesquisar sobre grandes nomes do ativismo negro. “Comecei a buscar muita coisa de música africana e brasileira. E, nessas gravações, gostava muito das sujeiras, do barulho das aldeias. Porque os microfones nunca eram os melhores, então vazava muita coisa do ambiente: criança, galinha, conversas… Isso tem o poder de te transportar para aquelas situações, eu queria isso com a minha música: criar situações, ambientes, que jogam luz sobre nossa história.” O resultado é um dos álbuns mais originais da atualidade. Boa leitura e ótima semana.
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