Fonte: Texto retirado do site Deustche Welle
Em 21 de junho de 1919, sete meses após o armistício, comandante ordenou que Frota de Alto-Mar fosse a pique numa baía na Escócia. Evento marcou as últimas baixas da Primeira Guerra Mundial.
Em 21 de junho de 1919, sete meses após a assinatura do armistício, nove marinheiros alemães morreram ao tentar defender o último vestígio de orgulho do Império Alemão: a Frota de Alto-Mar. Para os oficiais militares derrotados, os naufrágios de Scapa Flow foram “uma espécie de vitória tardia”, segundo o historiador militar alemão Michael Epkenhans.
“Eles não conseguiram derrotar os britânicos em alto-mar, mas ao menos garantiram que os britânicos e seus aliados não obtivessem sua frota de mares altos”, disse Epkenhans em entrevista à DW. “Era melhor do que nada e, quando retornaram para casa, sentiram-se como vencedores e foram tratados como heróis. Ao analisar as memórias de alguns dos almirantes, é possível ver que eles realmente se alegraram com o naufrágio.”
O Armistício de Compiègne, assinado em 11 de novembro de 1918 e que simboliza o fim da Primeira Guerra Mundial, estipulou que boa parte das embarcações da Marinha Imperial Alemã fosse entregue aos aliados, mas não havia consenso sobre o que deveria ser feito com a frota. França e Itália queriam assegurar algumas embarcações, enquanto o Reino Unido pleiteava pela destruição. Ao todo, 74 navios militares alemães foram rendidos e permaneceram em Scapa Flow, nas Ilhas Órcades, na Escócia, que serviu como uma das principais bases da Marinha Real britânica durante a guerra.
A história dos naufrágios, que inspirou peças e filmes na década de 1920, é das mais dramáticas: tripulantes subnutridos, insatisfeitos e doentes depois de meses a bordo, afrouxaram clandestinamente vigias, furaram buracos em anteparos e deixaram abertas as portas à prova d’água, enquanto aguardavam a ordem de seu comandante, o contra-almirante Ludwig von Reuter, que estava a bordo do navio Emden. Por sua vez, o contra-almirante aguardava o resultado das conversações de paz em Paris, nas quais deveria ser decidido o destino das embarcações alemãs. Historiadores acreditam que Von Reuter recebeu a ordem de afundar os navios a todo custo (uma violação do acordo de armistício), mas somente caso – como era de se esperar – os Aliados decidissem que estes seriam apreendidos.
A Marinha Real britânica suspeitava que os alemães planejavam afundar os navios e preparou planos para detê-los. E sete meses depois do acordo do armistício, Von Reuter encontrou uma oportunidade de ouro: um atraso na assinatura do Tratado de Versalhes, do qual o contra-almirante alemão não foi informado, mas tomou ciência de alguns possíveis termos, aliado a um 21 de junho de 1919 calmo e ensolarado, que fez com que a Marinha Real saísse da baía para realizar exercícios. Depois que Von Reuter enviou o sinal de ordem por volta das 11h20 da manhã, válvulas de gaveta, válvulas de inundação e canos internos foram abertos. Levou uma hora para as notícias chegarem ao almirante britânico Sydney Fremantle, que liderava os exercícios militares, e outras duas horas para sua frota retornar a Scapa Flow.
Os britânicos conseguiram evitar apenas o naufrágio de 22 navios, consequentemente 52 dos 74 navios naufragaram. Muitos dos destroços foram recuperados ao longo das duas décadas seguintes e rebocados para demolição. As sete carcaças mantidas no local se tornaram populares locais de mergulho. “Durante os naufrágios, alguns alemães foram baleados por se recusarem a voltar para seus navios e impedi-los de afundar”, disse Kevin Heath, um dos organizadores dos projetos de celebração e que ajudou a inspecionar os locais dos sete naufrágios mantidos na baía. “E 21 marinheiros ficaram feridos, a maioria de estocadas de baioneta ou agredidos a coronhadas.”
Ao todo, 13 marinheiros alemães da Primeira Guerra estão enterrados num cemitério nas Ilhas Órcades: nove que foram baleados no dia dos naufrágios e outros quatro que morreram durante o internamento – provavelmente vítimas da gripe espanhola. As condições durante o internamento eram precárias. Vinte mil alemães foram inicialmente trazidos para Scapa Low com os navios, embora o número de marinheiros tenha sido gradualmente reduzido para cerca de 1.800 na data dos naufrágios.
“Os ingleses eram muito rigorosos e tentaram de tudo para evitar que os marinheiros entrassem em contato com a população local”, contou Epkenhans. “A vida era bastante dura, especialmente no outono e no inverno. O tempo em Scapa Flow é bem difícil.”
“Eles não tinha permissão para sair dos navios. Seus suprimentos tinham que vir da Alemanha. Nada lhes foi dado. Portanto, deve ter sido bastante cruel para eles”, completou Heath.
A segregação foi parcialmente motivada pelo medo de uma epidemia de gripe a bordo, mas os britânicos também podem ter tido outro tipo de “contaminação” em mente: a disseminação do comunismo por toda a Europa. A revolução do ano anterior na Alemanha – o levante de Kiel – havia sido iniciada por marinheiros rebeldes e os vestígios de ressentimentos da classe ainda estavam a bordo.
“Ainda havia muita tensão entre os oficiais e a base”, explicou Epkenhans. “Muitos dos marinheiros ‘vermelhos’ deixaram claro que eram revolucionários e, até certo ponto, demonstraram que desprezavam seus superiores – por exemplo, batiam os pés no convés para impossibilitar que Von Reuter conseguisse dormir. Ele eventualmente teve que mudar de embarcação.”
Atualmente, os destroços remanescentes de todo este drama estão a 30 metros abaixo da superfície. A baía de Scapa Flow se tornou um popular ponto de encontro de mergulho, visitado pelos que querem vislumbrar os antigos navios militares do Império Alemão.
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